Coletivo do Pirarucu participa da estreia do filme “Pirarucu, o respiro da Amazônia”

Os representantes do coletivo do Pirarucu ao lado da diretora Carol Fernandes | Foto: Marcos Amend

Por: Renata Monty. Publicado em: 25.08.2023

Oitocentos quilômetros separam a Comunidade de São Raimundo, no Médio Juruá, de Manaus. Para percorrer o trajeto são necessários três dias de barco até alcançar a capital do Amazonas. Essa distância mostra o quanto as comunidades integrantes do Coletivo do Pirarucu e da marca Gosto da Amazônia precisam vencer para estarem praticando o comércio justo do peixe.

No último dia 20 de agosto, os ribeirinhos Manoel Cunha e Jorge Tapioca enfrentaram a viagem de três dias para acompanhar de perto o lançamento do filme “Pirarucu, o respiro da Amazônia”, um documentário sobre o manejo sustentável, da diretora Carolina Fernandes. A cerimônia de exibição aconteceu no emblemático Teatro Amazonas, construído com o suor de indígenas e nordestinos há 126 anos, onde a dupla fez um tour, deu entrevistas e falou para uma plateia de cerca de 700 pessoas.

“Aonde eu vivia não existia mais pirarucu grande. Então, o pesquisador Leandro Castello esteve lá em São Raimundo e durante dois anos observamos os lagos. Ele já estava indo embora, quase desistindo, quando eu disse: sei como vamos contar os pirarucus no lago. Foi aí que mostrei para ele como poderia ver os peixes respirando e diferenciá-los. Nasceu então a técnica da contagem dos peixes, que une o conhecimento popular com o científico”, explicou Jorge Tapioca durante a solenidade de exibição.

O Teatro Amazonas teve lotação máxima para a exibição do filme “Pirarucu, o respiro da Amazônia” | Foto: Marcos Amend

O gestor da Resex Médio Juruá, Manoel Cunha, morador de São Raimundo, destacou a importância de modelos de economia local, que beneficiem os verdadeiros autores do trabalho, através de um comércio justo.

“Estou muito feliz por estar aqui nesta casa que mostra a grandeza do que é a Amazônia, graças a exploração de borracha e a riqueza gerada, mesmo em um sistema de semi-escravidão. A borracha e o manejo do pirarucu hoje escrevem uma nova história, em que o desenvolvimento da Amazônia começa a ser feito pelas próprias pessoas da Amazônia, juntando o conhecimento científico com o daqueles que vivem na Floresta. Estamos gerando riqueza, mas com o equilíbrio social, ambiental e econômico para as pessoas daqui.. Sabemos que a Amazônia é extremamente importante para o nosso Planeta”, enfatizou Manoel.

Lideranças comunitárias deram os seus depoimentos sobre as experiências com o manejo do pirarucu selvagem | Foto: Marcos Amend

A diretora do documentário, Carolina Fernandes, conta que as comunidades retratadas foram extremamente acolhedoras e que a convivência foi sempre de muito aprendizado e partilha.

“Ter a chance de estar nessas comunidades nos devolve a sensibilidade de valorizar os pequenos grandes serviços ambientais que a Floresta nos oferece diariamente. É muito encantador poder testemunhar a força dos povos da floresta nas iniciativas de geração de renda de forma sustentável. Eles são um grande exemplo para o mundo”, salientou Carolina.

Mais do que simplesmente contar o caso do manejo, o filme “Pirarucu – o respiro da Amazônia” aponta um caminho. Através da história das comunidades da Reserva Extrativista do Médio Juruá, o documentário mostra como a integração dos conhecimentos tradicional e científico teve capacidade de criar um modelo de desenvolvimento que salvou uma espécie ameaçada de extinção, o pirarucu amazônico, gerou bem estar e renda para povos amazônidas e incentivou a proteção da floresta e seus serviços ecossistêmicos.

“Encaro o audiovisual como uma ferramenta para a conservação da Amazônia. Desejo que meus filmes sensibilizem o público a adotar novas práticas e a apurar o olhar. Meu legado será contribuir para dar visibilidade às práticas sustentáveis na Amazônia e fazer com que os povos da floresta sejam valorizados com verdade e poesia estética”, completou Carol Fernandes.

A diretora do filme Carolina Fernandes retratou as comunidades que desenvolveram o manejo do pirarucu sustentável | Foto:

O biólogo João Campos Silva, coordenador do Instituto Juruá, apontou a importância do documentário para mostrar ao mundo novas possibilidades de proteção e desenvolvimento da Amazônia.

“O manejo do pirarucu, muito mais que uma atividade produtiva, surge para inspirar novos modelos de desenvolvimento na Amazônia. Um modelo ancorado no conhecimento local e no conhecimento científico, protagonizado pelas populações tradicionais e que vem protegendo mais de 15 milhões de hectares de Floresta e, ao mesmo tempo que gera renda, empodera as mulheres e garante a dignidade do povo ribeirinho. Colocar esse modelo nos holofotes, como foi o caso do documentário no Teatro Amazonas, é mostrar para a sociedade que existem caminhos possíveis para um futuro mais próspero e justo socialmente e, ao contrário do que muitos pensam, esses caminhos estão sendo pensados pelos próprios Amazônicos e não por modelos externos, importados, que pouco dialogam com a realidade local. É preciso deixar claro como organizações de base, como a Asproc, podem ser instrumentos de desenvolvimento local e geração de riqueza, com a floresta viva”, esclareceu João Campos.

Adevaldo Dias, do Memorial Chico Mendes, falou do grande exemplo de sustentabilidade a partir do manejo de pirarucus | Foto: Marcos Amend

A importância das lideranças comunitárias estarem em destaque foi enfatizada por Adevaldo Dias, presidente do Memorial Chico Mendes.

“É importante destacar a inversão do modelo de economia desde aquela época em que os nossos pais e avós deram o seu sangue para construir esse teatro. Os que trabalharam aqui nesta construção geraram muita renda, porém estavam em uma situação de superexploração por aqueles que enriqueciam às custas do trabalho de seringueiros. E o manejo do pirarucu traz uma inversão dessa economia, onde a distribuição da renda vai para aqueles manejadores (as), para aquelas famílias que protegem a Floresta e que fazem a comercialização do seu produto. Por isso criamos a marca Gosto da Amazônia para tarzer um produto, o pirarucu de manejo, que distribui riqueza para as comunidades”, explicou Adevaldo.

Com mais de duas décadas de trabalho na atividade de manejo do pirarucu, Ana Cláudia Torres, do Instituto Mamirauá, falou a respeito da visibilidade gerada através do filme.

“Esse documentário representa muito para a história do manejo. Quanto mais tivermos iniciativas para evidenciar esse trabalho, que já vai completar 25 anos, e o quanto isso tem mudado na vida das pessoas, essa apropriação do sentimento de proteção, do conhecimento de sociobiodiversidade. Isso é muito importante. Primeiro para reforçar essa identidade amazônica, mas também para estimular essa bioeconomia. Parece um conceito abstrato, mas a gente consegue enxergar muito bem com a atividade do manejo do pirarucu”, destacou Ana Cláudia, do Instituto Mamirauá.

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SOBRE O FILME

Produzido pela Banksia Films e sob direção de Carolina Fernandes, produtora audiovisual radicada no Amazonas há 12 anos, o filme mostra como o manejo do pirarucu foi desenvolvido, cobrindo especialmente a importância do conhecimento tradicional aliado ao conhecimento técnico de pesquisadores do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá.

O filme também mostra como a região do Médio Juruá saiu de um cenário de trabalho análogo à escravidão para se tornar um verdadeiro exemplo de desenvolvimento sustentável na Amazônia.

PRÓXIMAS EXIBIÇÕES

BRASÍLIA

Data: 5 de setembro (terça-feira)
🕒 Horário: 20h30 | Abertura a partir das 20h
📍 Local: Auditório do CONTAG – SMPW Q 1 – Núcleo Bandeirantes, Brasília – DF
🎟️ Entrada gratuita, sem necessidade de retirada prévia de ingressos.

Texto: Renata Monty. Publicado em: 28.08.2023